CACHAÇARIA ÁGUA DOCE

Edifício para abrigar unidade de uma franquia sem padronização arquitetônica.

Esse projeto nasceu de um interessante desafio: a solicitação inicial determinava o emprego de certos materiais e elementos, o que poderia resvalar para uma (indesejada) abordagem “temática”.

Porém, a proposta escapa de uma solução clichê, imitativa ou meramente cenográfica através de um partido simples, conciso e expressivo: duas empenas de terra (1) sustentam dois elementos de madeira - um plano (cobertura do salão) e um volume horizontal esculpido (mezanino), sob o qual configura-se uma varanda.

No solo, um terceiro elemento, também de madeira - que contém espaços de apoio e se converte na escada para o mezzanino - estende-se longitudinalmente até o alinhamento do lote com a rua e “costura” os três espaços: salão, varanda e pátio de acesso.

Nos fundos, um corpo térreo abriga sanitários e áreas de apoio à produção.

Mauro Ribeiro da Rocha


O tamanho do lote era um dos fatores limitantes (2) face ao programa de necessidades, aspecto atenuado pela continuidade espacial do térreo - que integra salão, varanda e pátio de acesso -, reiterada pela abertura total da varanda e o piso (ladrilho hidráulico monocromático) como plataforma única desses espaços.

O mezzanino tem caráter intimista. Em estrutura metálica (vigas-treliça) vedada com painéis modulares de madeira (2,50m), pré-montados no local. Esses últimos são uma trama de tábuas e 'cordões' (sarrafos boleados), solução que concilia beleza e técnica (evita as deformações e separação das peças, inerentes ao comportamento da madeira).

O aspecto final é de uma grande peça inteiriça de madeira esculpida, suspensa pelas empenas.

O paredão-painel (coleção de cachaças) possui furos revestidos, permitindo alterar layouts das prateleiras (de aramado) para garrafas e eventual comunicação visual. Apenas os móveis de apoio aos serviços são design incluso no projeto. As mesas e cadeiras são fornecidas (padrão da franquia).

O plano-cobertura é destacado do corpo principal e expande-se em balanços (como beirais) em ambas as extremidades.
Além de solução estética de leveza e luz natural, proporciona importante ventilação cruzada no salão.


As fendas do mezzanino (como uma "mega-veneziana") proporcionam, além de iluminação natural indireta, ventilação natural integrada à principal (cruzada-superior) entre a cobertura e o corpo do salão.


A “idéia geradora” define o salão como espaço fundamental e integrador, que se expande em duas direções: na vertical, incorpora o mezanino (pé-direito duplo, 7,20m) e na horizontal funde-se à varanda e ao pátio de acesso.

Essa continuidade espacial é reafirmada pela abertura total da varanda e pelo piso que se estende até o passeio público (ladrilho hidráulico monocromático, cor terrosa clara, referência ao “chão de terra batida”, que evoca um hospitaleiro terreiro ou quintal). Assim, convidativa, essa casa “desdobra-se” ao exterior, ao ambiente urbano, à rua.

O vão da varanda é fechado com esquadrias-painéis móveis e pode ser totalmente aberto, proporcionando a continuidade salão-varanda-pátio de acesso.

O projeto luminotécnico (3), além de feliz sintonia com os conceitos do projeto arquitetônico, incluiu o design de todas as luminárias das áreas de público. Como exemplo, as arandelas dos sanitários: o conhecido "copo americano", tão comum nos bares de todo o Brasil, foi adotado como difusor de luz por seu caráter iconográfico e pela superfície prismática, com interessantes projeções. O copo é montado em uma peça inspirada em máquinas e equipamentos simples e é fixo por sua própria conicidade.


Arquitetura: Mauro Ribeiro da Rocha
Luminotécnica: Marcos Castilha
Construção: RIGEL
Terreno: 525,00 m²
Área construída: 400,00 m²


(1) Paredões-empenas: originalmente concebidos em solocimento, referência à construção com terra.
Porém, durante o desenvolvimento, questões técnicas face às dimensões dos mesmos - surgimento natural de fissuras, mesmo com paginação tecnicamente adequada - foram decisivos para a recusa do cliente e redirecionaram à solução de tijolões assentados com argamassa tonalizada na mesma cor. Penso que esse detalhe resguardou a contento o conceito e a mensagem, pelo aspecto final de "peças de terra assentadas com terra".

(2) 15 x 35m = 525m². O orçamento era o outro limitante, levando à busca por soluções econômicas, que unissem engenhosidade e simplicidade executiva.

(3) Arq. Marcos Castilha, autor do projeto luminotécnico. Este trabalho venceu o “Prêmio Nacional ABILUX de Projetos de Iluminação 2005”, categoria Hoteis, Restaurantes, Bares, Hospitais e Clínicas.”.
Publicado como matéria de capa na Revista LUME, out-nov/2005.

(4) Publicações:
Galeria da Arquitetura
Archdaily Brasil
Bim Bon
Revista Office Style